"Please, teach me gently how to breathe
And I'll cross oceans, like never before
So you can feel the way I feel it too
And I'll mirror images back at you
So you can see the way I feel it too"
Shelter, The XX
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Sou dessas a quem a resposta ocorre duas horas depois do final da discussão.
Eu deveria ter dito tudo o que sentia na última vez em que conversamos. A gente sempre acha que vai poder falar, né, que tudo vai sair direitinho, como num filme; aí vem a vida e dá uma gargalhada gostosa, debochada, bem na sua cara. Tipo a Dercy. Na hora, fiquei tão perdida, tão tonta, que não falei, e agora as coisas estão engasgadas aqui, me consumindo em meu próprio fogo brando.
*
Eu deveria ter dito o quanto cada palavra sua estava me magoando. Devia ter interrompido você, me feito de doida, negado tudo, fingido que a Internet caiu. Qualquer coisa que parasse a conversa. Mas quis dar uma de forte e abrir a carne até o osso. Até a medula, se fosse possível.
Pois é, abriu, rasgou, e agora eu estou reclamando. Esta maluca, você já sabe, meu lindo: sou eu.
Deveria ter te contado um segredo: uma das maiores preocupações que tenho na vida é achar que atrapalho os outros. Por isso, sempre tentei respeitar você ao máximo, amor. Ah, sim, mesmo que significasse não ter você.
Deveria ter te lembrado das incontáveis oportunidades em que ficamos sozinhos e que nunca fiz absolutamente nada que forçasse você a uma "atitude" (afe). Preservei seu espaço, aceitei seu tempo, sua necessidade de auto-afirmação e, principalmente, poupei nossa amizade de um constrangimento.
Nunca exigi nada. Nunca liguei sem parar, não cobrei sua presença, não chamei você de madrugada. Não tenho uma lista dos gestos que acho "próprios de um homem" (afe, de novo). Foi esta minha falha, então?
Desculpe, não espere isso de mim. Sou incapaz deste grude (e, se você acha que marcar no Facebook é grude... "You know nothing, Jon Snow"). Esse clichê não sou e nunca serei eu. Sou uma mulher e acredito, com todas minhas forças, que a liberdade é a forma mais delicada, respeitosa, sábia e extrema de amor. A leap of faith, você diria. Eu sabia: se você me quisesse, viria. Se não, ainda seríamos amigos.
E, por mais que você duvide, baby, a sua amizade era importante pra mim. Muito.
Eu deveria ter perguntado. Ah, devia. Esta droga de pergunta não sai de minha cabeça... Se nossa amizade é tão importante pra você, se eu sou tão cara ao seu coração, e, se você se fez de desentendido todo esse tempo, na esperança de que eu desistisse... Por que jogar tudo para cima, no último minuto, quando eu disse literalmente "estou tirando o time de campo"? Era só ficar quieto mais uma única vez. Por que me magoar assim, tão deliberadamente?
Por quê? Para quê? Eu não mereço. Você não é leviano assim. Não é possível que eu tenha me enganado tanto com você.
Ou é possível, querido? O gostar é realmente cego e tonto desse tanto?
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Eu deveria ter contado o quanto me senti jogada pra escanteio quando você me falou de outra. Deveria ter gritado, em caps lock, que não tô nem aí para esta criatura; que por mim, tanto se me dá se ela fica brava com o que lê aqui: se não quer ver você em meus textos, que não venha, que não leia. Ponto. Não vou me censurar, nem me conter, por alguém que nem sei quem é. Gosto de você, você está em mim (sim, está, não te desliguei, não funciono assim) e, pelo menos até este post, me inspirou.
Deveria ter pedido menos condescendência, menos "você é ótima", "quem perde sou eu", "você cria um bom clima" (ah, como essa doeu), e exigido mais "gosto de você", "como você está?", "vem aqui, me dá um abraço". Sou besta, queria que você se preocupasse comigo, mesmo depois de tudo. Demorou uns dias, depois de nossa discussão, para eu aceitar que nem um "tudo bem?" eu receberia. Burra. Burra. [com pequenos socos no cocoruto, pra ver se aprendo]
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Deveria ter revelado, enquanto você me despejava suas verdades no colo, que eu chorava. Eu deixei você digitar tudo o que queria sem ter de me encarar. Então saiba: eu chorava. Choro sem parar há um mês. Tenho um oco no peito, uma dor no coração, a pele sensivel, a alma quebrada. Pelo menos isso, você viu ontem em mim, não é?
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Deveria ter falado que, desde que nos conhecemos, me senti tão à vontade com você como não me sinto com muita gente de quem sou mais íntima. Que sempre olhei em seus olhos com toda a verdade e com toda a delicadeza de que sou capaz (e, olha, moço, isso não é pouca coisa, não), e foi isto que me aproximou de você: seu espelho.
É isto - a verdade e a delicadeza que um dia enxerguei tão grandes em seus olhos - que faz com que a palavra "ódio" não exista no meu vocabulário quando penso em você, querido. É isto que me faz ver sua foto e ficar feliz de ver você de olhos brilhantes, mesmo que os meus estejam transbordando de lágrimas.
Me explica, você que é bem mais objetivo que eu, como é que pode a gente ficar feliz e tão triste ao mesmo tempo? Assim, fácil: ontem eu descobri. Meu coração ficou pequenininho, chorei, mas eu pensei "olha o tamanho deste sorriso; olha o brilho no olho dele". E fiquei contente por você, mesmo estando tão infeliz.
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Deveria ter falado o quanto você foi injusto reclamando dos meus escritos aqui no blog. Quantas vezes eu falei pra você que minha vida é escrever? Que, mesmo enquanto estou quieta, tem um pedacinho da minha cachola pensando em histórias? Quantas vezes, baby, eu disse da minha insegurança em publicar meus textos?
Cada coisa que eu escrevi inspirada em você, cada palavra, cada vírgula, foi pensada com tanto carinho, foi digitada com tanto bem-querer.
Sabia que mais de uma pessoa me perguntou "mas como este cara consegue resistir às coisas que você escreve"?
Foi meu jeito de dizer "ei, olha, eu tô aqui, gosto de você, presta atenção em mim". Um homenzinho engraçado carregando uma placa enfeitada com seu nome. Meu outdoor. Meu megafone particular. Falar dos meus textos, puxa... e se eu pedisse pra você abandonar suas criações? Como você se sentiria?
Golpe duro. Junte com a anemia (com a qual, obviamente, você não tem nada a ver) e eis que, de novo, eu não tô dando conta, não. Sorry.
Eu sei, eu prometi que não ia mais escrever. Mas eu sou dessas, eu não cumpro, principalmente quando a promessa é você, meu amor. Eu deveria ter dito tanta coisa. O erro foi meu, eu sei, já assumi todas as culpas. Ajoelhei no milho, fiquei no cantinho do pensamento e tudo.
Eu tinha que ter falado naquele dia. Deveria ter falado tudo isso.
Guardei: transbordou. Então tá. Já vai vendo se consegue me desculpar mais uma vez, coração, mas agora eu falei.
Bom diálogo monólogo. A escrita nos salva! Catarse. Mas a vida me ensinou, amor bom é amor facinho.
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