Eu estava acordada e sonhei.
Em meu sonho, eu nadava num lago castanho escuro e tormentoso; me perdia naquelas águas frias e me esquecia completamente de mim.
Ali, dentro da escuridão, enquanto nadava eu só pensava em como ser mais: atraente, interessante, bonita, charmosa, divertida, qualquer coisa que pudesse tranquilizar aquelas águas. Algo qualquer que pudesse levar paz àquele coração.
Como se, transformando-me, eu tivesse algum tipo de controle sobre a tormenta do lago. Como se eu tivesse o poder de acalmar suas águas e pudesse, então, navegar tranquilamente ali.
Sonhei com risos compartilhados, com ideias trocadas, com longas conversas. Sonhei com a vontade de contar as minhas novidades, de mostrar trabalhos concluídos (e receber elogios, óbvio, que não sou de ferro), de me admirar com convicções sólidas, talento de sobra e humor. Ácido e único, que sempre me surpreendia nos momentos mais improváveis.
Sonhei em receber carinho e delicadezas, desses construídos no dia a dia. Uma rotina leve, com alento suave de amizade, cheiro azedinho de alecrim, sussurros baixinhos e sabor de pé-de-moça. Ou pé-de-moleque.
Eu sonhei.
Tive um sonho com trilha sonora de músicas e risadas. As nossas. Povoado pela vontade desmedida de falar dos meus filmes e livros prediletos. Do meu trabalho voluntário e de quanto meus amigos são importantes pra mim. Em meu sonho, eu escolhia as melhores poesias, as mais encantadoras, só para ele...
Sonhei com uma doçura que só aparecia em momentos únicos para mim. Com mãos lindas que me acolhiam, acarinhavam e tocavam melodias delicadas. Só para mim, eu sabia. Sonhei em transformar um amigo em um afeto, em um amante, em um amor. Com olhos plenos de ternuras ao me fitar. Com dias de companhia e noites de cálidas de amor. Juntos.
Eu sonhei, tenho certeza que sonhei.
*
Você pode até duvidar, mas meus sonhos me deixaram mais feliz. Me botaram um brilho de estrela nos olhos, um cometa no cérebro e, fato inédito, uma certeza firme no coração: a de que, de um jeito ou de outro, eles se realizariam.
Eu acreditei. Confiei. Esperei. E sonhei, sonhei. Ah, tanto.
*
Um dia, o lago secou. A música parou de tocar. As mãos deixaram de se estender pra mim e me deram as costas, sem a menor cerimônia ou pudor.
Bem que eu me esforcei. Mas não pude, não consegui ser nada do que tentei ser. Será que foi isso, meu Deus?
Meu sonho se escapou por entre meus dedos. Se perdeu na neblina, afundou na água, sem que eu entendesse aonde foi que errei. Não vi aonde ele foi e, agora, parece que não o reconheço mais. Olho nos seus olhos escuros e, mesclado ao imenso afeto que sinto, ao impulso que tenho de abraçá-lo, de segurar suas mãos e pedir "Fica!", me vem um sentimento de fracasso. De incompletude.
Aqueles acordes sem resolução, palavras sem eco, perguntas sem resposta, que só servem para atormentar: o "...e se?"; o "não deu"; o "quase". Por um triz, passou raspando - e eu na beira da estrada.
Meu brilho nos olhos se apagou, as estrelas e os cometas se foram, e as dúvidas, muitas, enormes, incontáveis, vieram morar comigo, de mala e cuia, junto com uma tristeza agridoce e pungente. Dói, tanto e todo dia.
Acordei: noite e dia, há um tempo já, sonho lágrimas de olhos abertos, procurando minha alegria, sem encontrá-la.
"Daquilo que não pode ser, a gente olha através", dizia a personagem da Fernandona em "Saramandaia".
E agora, meu amor, só posso pendurar um sorriso no rosto e olhar através de você.
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