Todo mundo contando histórias sobre os pais. Não poderia deixar de contar umas sobre o meu, eu, a escrevinhadeira da família.
Não foi - não é - fácil ser filha do seu Edson. Meu pai tem um carisma natural, é bom de papo - daqueles que fala baixo, que escuta bem e aconselha - e conquista legiões de fãs por onde passa.
Foi professor de Educação Física em uma escola municipal com 4 mil alunos num bairro carente de São Paulo. Era, sem muito esforço, e em grande parte das vezes, médico, dentista, conselheiro, psicólogo, assistente social, nutricionista, perueiro, professor particular... E pai destas crianças.
Você deve pensar: bom, não deve ter sobrado muito pra filhas.
Eu não vou bancar a santa e não dizer que muitas vezes tive ciúme daquelas crianças que acessavam o professor com tanta urgência. Que não tive vontade de matá-lo por cada vez (e ah, era quase todo dia) que eu amarguei o banco gelado de mármore da escola, esperando-o pra ir embora.
Mas nunca, nunca, NUNCA. Em nenhum momento tive a sensação de não ter um pai presente. Nunca.
Até uns 10 anos, minha mãe trabalhva à noite (na mesma escola, por sinal - ô vida! - mais crianças pra disputar os MEUS COLOS) e quem cuidava de nossas necessidades (jantou? tomou banho? escovou os dentes? separou o uniforme?) era papai.
Pense numa pessoa tranquila. Meu pai não sai do sério, não levanta a voz. Nunca ameaçou castigo físico - nunca ouvi "olha que chamo teu pai".
Acho que minha casa sempre foi meio feminista, né. Quatro mulheres, mas, também, pela postura dele. "Meu maior medo é ver você dependente de um homem". E me criou pra ser assim (paizinho, a culpa de eu estar solteira é sua, haha).
Eu tenho uma lembrança vívida do dia em que aprendi a andar de bicicleta sem rodinhas. Lembro exatamente do momento em que deixei de sentir sua mão em minha nuca, me segurando, e de como consegui me equilibrar, e de olhar pro lado e ver a expressão de alegria no rosto dele. "Tá andando sozinha, filha!!"
Lembro como estava nervosa na minha festa de 15 anos, porque tinha uma escada (uns cinco degraus) que eu tinha de descer e, óbvio, estava com medo de cair. A expressão estava lá. E minha dor de barriga acalmou.
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Meu pai "adotou" um rapaz excepcional que rondava pela escola. A molecada zoava o pobre e ele vivia sujo, largado pelo cantos. Um dia, virou a sombra do seu Edson: era pra cima e pra baixo ajudando, com a roupa em ordem, bem cuidado, falante e feliz.
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Adoro contar como meu pai compra absorvente pra gente. Ele compra. Não tem nojinho, não acha que é tabu, nada disso. Ele é absolutamente desligado pra cortes de cabelo, tinturas, maquiagens e nomes. Mas elogia a gente que é uma beleza.
E é uma pessoa divertida!
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Nunca ouvi "você não pode fazer isso" ou "isso não é coisa de menina fazer". Bem que ele tentou me cativar pro clube da pescaria, mas eu não pude: tenho dó demais dos peixinhos pra me aventurar. Ele tentou também me transformar em uma de suas atletas, mas o componente "disputa" nunca foi meu forte. Minhas batalhas são outras.
Desculpa, pai. Acho que peguei um caminho que, talvez, não seja o que você imaginou pra mim. Tomara você esteja contente com as minhas decisões.
Tomara, pai, que mesmo com todas as nossas brigas, todas as minhas ranhetices, você entenda todas as vezes que eu digo que te amo.
Tomara que eu continue sentindo a sua presença constante, forte, inabalável, aqui, do meu lado, segurando minha nuca, nas minhas lutas.
Te amo!
Me emocionei! Parabéns pelo texto e obrigada por compartilhar essas histórias...
ResponderExcluirLindo texto com um certo desabafo.....rs, mas sem dúvida com muito amor!
ResponderExcluirParabéns.
Bjs
Rubens Barrence
:)
Linda declaração de amor ao seu pai !!!! Tudo o que você é , tem a marca do Edson, ser responsável e assumir a si própria !!
ResponderExcluirSem condições para escrever agora. Me senti tão pertinho de tudo...
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ResponderExcluirSimplesmente lindo! ❤
ResponderExcluirEu era uma das crianças q estudava. No Mangabeira !!!!
Que lindo texto!!! Confirmo tudo que você escreveu, pois tive o prazer de trabalhar com seu pai, o famoso Prof Edson, e sua querida mãe , a exigente e competente diretora da EMPG Octavio Mangabeira " Dona Maria Inês". Amo essa família !!!
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