Depois das horas

60 anos.
Um filho, uma carreira bem-sucedida.
Viúva cedo, ela desfrutava, na terceira idade, de uma gorda pensão do marido, mais o dinheiro da aposentadoria e da renda que obtia de aluguéis de imóveis herdados.

Quando se aposentou, resolveu que iria curtir a vida.
Fazia aulas de dança, de inglês, computação, música, ginástica e o que mais lhe desse na telha.
Independente, viajava à vontade, saía com as amigas, comprava o que bem entendia. Era "bonitona" e não aparentava a idade... Ainda assim, vivia uma sensação de incompletude.

Não conhecera o amor. Casara-se muito cedo, com um homem muito mais velho e amigo de seu pai. No final das contas, trocou uma figura de autoridade por outra.
Às vezes, tinha a sensação de que a maioria das menininhas, as adolescentes mesmo, tinham mais experiência afetiva do que ela. Um único homem, machista, egocêntrico, que a procurava sistematicamente com a única intenção de se aliviar.

Não sabia o que era gozar. "Orgasmo", para ela, nunca existiu, porque sua criação rígida incutiu-lhe, no fundo da alma, a noção de que mulheres não podem sentir prazer. Sozinhas, jamais. Uma viúva ter sexo casual, então? Devassa, no mínimo.

Ela descarregava seus anseios - e nem sabia de onde vinham todos aqueles sentimentos sensuais - nas milhares de atividades que se impunha. Ao final do dia, exausta, não lhe restavam forças para pensar em calores ou vazios.

Claro, nem sempre dava certo. Havia certos dias em que ela sonhava e acordava suada, esgotada, com o coração palpitando e a calcinha úmida. Envergonhada, botava a culpa no filme que assistira antes de dormir, no prato apimentado que degustara e até nos livros de cabeceira que lia.

Sem contar que uma companhia masculina fazia falta. Para as pequenas bobagens do cotidiano, e para dançar, para cozinhar com ela, alguém que fizesse companhia no sábado (e no domingo, também)... ela gostaria muito de descobrir por si o que tanto suas amigas valorizavam nos homens que as faziam perder a cabeça e o bom-senso.

Mas as coisas não aconteciam, e ela também não procurava.

Não se sentia à vontade perto de outros homens; criou um ideal de beleza, conduta e caráter quase impossíveis de serem atingidos - inconscientemente, uma maneira de se proteger e nunca se expor ao "perigo" de uma relação.

Tudo mudou quando o conheceu.

Aquele homem não era nada - absolutamente nada - do que ela desejava. Baixinho, meio largado, intelectual e feioso: a antítese das coisas que ela queria para si. Mesmo assim, bastou meia hora de conversa e ela se viu encantada. Naquele primeiro dia, já se despediu pensando como seria beijar um homem de bigode.

À noite, teve mais um de seus sonhos. E acordou envergonhada com a altura de seus gemidos: será que o filho a escutara? Sentada em sua cama, lutando com o calor, decidiu que não deixaria a vida passar em branco.

Usou o (pouco) que sabia: roupas bonitas e perfumes gostosos. Bate-papos nada casuais e olhares lânguidos. Sorrisos tímidos e toques sutis. Ele, escolado e mais do que versado nas relações, um dia lhe disse, sem a menor cerimônia: "Minha querida, já passamos da fase dos subterfúgios. Vamos pular essa manha toda e assumir o que realmente queremos? Que tal?".

Medrosa - apavorada, para ser sincera consigo mesma - ela topou. Mas foi absolutamente honesta com ele. Contou que não sabia quase nada daquilo de relacionamentos. De sexo, então, nem teve a coragem de falar. Mas a praticidade que ele sempre demonstrou no trato cotidiano se transformou em absoluta doçura com ela.

Namoraram à moda antiga: ele respeitou seu tempo, seu espaço e seu ritmo. Cortejou-a, fez com ela todos os programas de casal, conversou no telefone até altas horas, como adolescentes. Riram juntos e brincaram. Até que em um dia ela lhe contou sobre suas inseguranças. "Vou lhe mostrar, linda, que com amor o tesão é delicioso", ele lhe respondeu, sorrindo.

Ah, se ela imaginasse. Se ela soubesse. Se ela sonhasse que na sua idade ainda era possível sentir tudo aquilo, que ainda dava pra se entregar por completo... Se ela tivesse sequer desconfiado de tudo isso, teria se aventurado desde cedo.

A primeira noite dos dois foi de enlouquecer. Desinibido, ele não teve o menor pudor em se despir diante dela. Não teve vergonha de seus pelos já grisalhos, de sua barriga protuberante, nem de lhe dizer que precisava de mais tempo para se excitar. Beijando-a e sussurrando em seus ouvidos, ajudou-a a também se desnudar - e aquele brilho nos olhos, aquela excitação, não poderiam ser fingidos. Ele não se incomodou com seus seios flácidos, com seu estômago meio saltado, muito menos com as estrias da gravidez. Tudo nele dizia "linda" - principalmente o começo de ereção que se lhe esboçava.

Ela nunca pensou que poderia sentir prazer com uma mordida de leve no lóbulo da orelha. Que poderia se excitar com as mãos de um homem tocando suas costas de leve, ou com os pelos de seu bigode roçando-lhe as coxas. Nunca sonhou que poderia sentir prazer dando prazer para alguém, ouvindo os gemidos de seu namorado quando lambeu seu pescoço, quando lhe manipulou o sexo e o provou, meio desajeitada.

Ele fez questão de prolongar aquele jogo de excitação entre os dois antes de chegar à penetração em si. Fez questão de deixá-la meio desvairada, doida para tê-lo dentro de si. Quis mostrar-lhe que sexo era mais do que ela sabia, que era possível rir e chorar, sussurrar e gritar, tudo ao mesmo tempo.

Quis que ela montasse nele. Evitou o papai-e-mamãe de propósito. Conduziu seu quadril naquela dança para lhe mostrar que a mulher pode ser ativa no sexo para também sentir prazer. Botou-a de quatro, de joelhos. Comeu-a de pé (sim, comeu-a, o tesão já era tanto que não era mais "fazer amor"). "Por que não pode?", dizia a ela, com um sorriso safado. Esgotado, ainda a fez gozar de novo ("Boca e mãos são pra isso, meu bem").

Quando acordou no dia seguinte, ela estava estafada. Mas já não tinha vergonha de si. Muito menos dos outros: andou nua na frente dele, tomou a iniciativa para transarem mais uma vez. Fez (e pediu) o sexo oral. Gritou e gemeu como nunca sonhou que faria. E saiu do apartamento dele com um sorriso que nunca tinha dado antes: meio lascivo, de viés, como se agora detivesse um conhecimento que o resto do mundo não tinha.

Na semana seguinte, passou no sex shop e, além de lingeries e brinquedinhos para usar com o namorado, comprou um vibrador para usar sozinha.

""Próximo passo? Descobrir os prazeres do sexo solitário", pensou ela, usando o seu novo sorriso.

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