A damn cold night

Uma noite gelada e a moça sozinha na cama.

Uma noite fria. Dois cobertores, meias, a janela fechada... e nada a fazia se sentir aquecida. Os pés se contraíam, debaixo das cobertas. Os ossos, mais salientes pelo emagrecimento acelerado no último mês, doíam ao baterem uns contra os outros.

Uma noite gelada, e a ausência dele transformava a metade vazia da cama de casal num imenso campo de futebol. Num deserto. Num tormento.

Não havia posição que fosse confortável para ela. Normalmente inquieta, ela se virava sem parar... faltava-lhe a presença tranquilizadora do rapaz, seu ressonar calmo, seu braço, trazendo-a para si. A mão, leve, possessiva, em seu seio.

Havia um buraco no peito da moça. Aquele, que estivera lá sua vida toda e que ele apagara. Que ele preenchera de um jeito tão sutil que, por um tempo, ela se esquecera de como era intensa aquela dor. Agora, quase não dava para respirar quando se dava conta que ele não voltaria. Que ele já não se importava com ela.

Ou que talvez nunca tivesse realmente se importado - e o buraco ficava cada vez mais fundo.

Mas então ela fechava os olhos e se lembrava dos beijinhos suaves que ele lhe plantava na ponta do nariz, das carícias despreocupadas e meio adormecidas quando seus corpos se misturavam, cansados e suados...

Ela se lembrava de como ele a conduzia, delicadamente, pelo lado de dentro da calçada, e de como lhe enfiava a mão pela nuca, porque sabia que aquilo a enlouquecia. De que deixava de fazer a barba no dia em que iam se encontrar, porque sabia que ela gostava da sensação dos pelos ralos no pescoço.

Ela apertava os olhos e ainda sentia o cheiro dele, impresso em cada um de seus poros, seu gosto, tão doce, no fundo da boca e a textura da língua dele passeando por seu corpo e enlouquecendo-a.

O sorriso. Ah, o sorriso. Um meio sorriso, de lado, como uma criança tímida. Ela quase podia imaginar uma criancinha de olhos grandes com aquele sorriso.

Lembrava-se das mãos entrelaçadas, do peso do seu corpo sobre o dela e de seu olhar deslumbrado, quando lhe tirava o sutiã. De como seu coração disparava com uma única palavra no celular: "cheguei".

O buraco no peito diminuía. Ou aumentava - ela nunca conseguia definir a sensação, porque a dor a entorpecia. Os olhos se enchiam de lágrimas e ela se culpava, pela milionésima vez.

Por tudo. Por se apaixonar, por não dizer, por ter se aberto tanto, por ter chorado na frente dele: justo ela, que sempre se gabava de se trancar no banheiro para não chorar na frente de ninguém. Por ter tido esperança, por ter imaginado um futuro.

Por ter esperado, durante um tempo, que ele caísse em si, amolecesse o coração e voltasse para ela.

Por sentir frio. Por que sentir tanto frio, Deus do céu?

Droga de noite gelada. Droga de cama vazia.

Droga de coração burro, que sente tanto, tanto frio. Que ama tanto, tão errado, e não sabe desamar.

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